Memorial da América Latina
O Memorial da América Latina é um centro cultural, político e de lazer, inaugurado em 18 de março de 1989 na cidade de São Paulo, Brasil. O conjunto arquitetônico, projetado por Oscar Niemeyer, é um monumento à integração cultural, política, econômica e social da América Latina, situado em um terreno de 84.482 metros quadrados no bairro da Barra Funda. Seu projeto cultural foi desenvolvido pelo antropólogo Darcy Ribeiro.2 É uma fundação de direito público estadual, com autonomia financeira e administrativa, vinculada à Secretaria de Estado da Cultura.3
O complexo é constituído por vários edifícios dispostos ao longo de duas áreas unidas por uma passarela, que somam ao todo 25.210 metros quadrados de área construída: o Salão de Atos, a Biblioteca Latino-Americana, o Centro de Estudos, a Galeria Marta Traba, o Pavilhão da Criatividade, o Auditório Simón Bolívar (que sofreu um incêndio na tarde de 29 de novembro de 2013), o Anexo dos Congressistas e o edifício do Parlamento Latino-Americano. Na Praça Cívica, encontra-se a escultura em concreto, também de Niemeyer, representando uma mão aberta, em posição vertical, com o mapa da América Latina pintado em vermelho na palma.2
O memorial possui um acervo permanente de obras de arte, exibidas ao longo da esplanada e nos espaços internos, e conta com um centro de documentação de arte popular latino-americana. A biblioteca possui cerca de 30 mil volumes, além de seção de música e imagens. O complexo promove exposições, palestras, debates, sessões de vídeo, espetáculos de teatro, música edança.2 Mantém o Centro Brasileiro de Estudos da América Latina, organização de fomento a pesquisas acadêmicas sobre assuntos latino-americanos. Publica regularmente a revista Nossa América e livros variados.4 Serviu de sede ao Parlamento Latino-Americano entre 1989 e 2007 (atualmente localizado na cidade do Panamá).5 6
A ideia de criar uma instituição na cidade de São Paulo devotada ao aperfeiçoamento das relações políticas, sociais, econômicas e culturais latino-americanas remonta ao governo de André Franco Montoro7 , em meados da década de 1980, em um contexto cultural marcado por avanços democráticos no continente e por uma maior convergência de interesses entre o Brasil e países da América Latina - nomeadamente a Argentina, com quem o país firma a Declaração de Foz do Iguaçu em 1985, acordo base para o surgimento futuro do Mercosul.8 Durante sua gestão no governo paulista, Franco Montoro criou o Instituto Latino-Americano (ILAM), com o propósito de ampliar, sobretudo, o intercâmbio cultural entre os países da região. O ILAM organizaria um acervo bibliográfico de aproximadamente 10.000 itens, além de fotografias, vídeos e outros materiais relacionados à cultura latino-americana, que serviria futuramente como acervo base da biblioteca do memorial.9 10
A construção efetiva do memorial e a idealização de seu programa cultural, no entanto, só seria iniciada durante o governo de Orestes Quércia, que pretendia erguer em São Paulo “o mais importante centro cultural do continente latino-americano”.11 Para esse fim, Quércia incumbiu o arquiteto Oscar Niemeyer de projetar um complexo monumental, a ser construído em um terreno público de aproximadamente 90.000 metros quadrados no bairro da Barra Funda.12 Niemeyer concebeu um complexo composto de seis edifícios espalhados por duas praças unidas por uma passarela: a biblioteca, o Salão de Atos, o restaurante (atual Galeria Marta Traba), o Pavilhão da Criatividade, o auditório e o centro de estudos. Posteriormente, seria adicionado o edifício-sede do Parlamento Latino-Americano. O arquiteto previu o complexo como uma “ilha arquitetônica”, com formas alvas e arrojadas, que servisse também à reabilitação o tecido urbano no entorno.11 A temática lhe agradava, como declararia posteriormente:
Poucos temas me deram tanta alegria ao projetá-los como o Memorial da América Latina. Primeiro pelo sentido político que representava. Reunir os povos deste continente para juntos discutirem seus problemas, trocando experiências, lutando pelos direitos desta América Latina tão explorada e ofendida. Depois, porque se tratava de um conjunto de prédios que, bem projetados, poderiam criar o que em arquitetura chamamos de espetáculo arquitetural. |
— Oscar Niemeyer13
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Por sugestão de Niemeyer, o antropólogo Darcy Ribeiro foi convidado a elaborar o projeto cultural para o memorial, colaborando também na definição dos elementos necessários ao complexo arquitetônico.12 Chefe da Casa Civil durante o governo João Goulart, Darcy Ribeiro teve seus direitos políticos cassados após o golpe militar de 1964, vivendo, desde então, exilado em vários países da América Latina (trabalhou noUruguai, na Venezuela, no México e foi assessor de Salvador Allende no Chile e de Velasco Alvarado no Peru), tendo dessa forma grande afinidade com a temática do projeto.14 15 Ribeiro também havia colaborado anteriormente com Niemeyer na concepção dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), outro motivo que levou o arquiteto a recomendá-lo para a função.16
Darcy Ribeiro contou com o apoio do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) na concepção do projeto cultural. Ademais, convidou diversos intelectuais ligados à USP para elaborar o perfil da futura instituição, tais como Antonio Candido, Alfredo Bosi eCarlos Guilherme Mota. O projeto se baseava na premissa de propor o agrupamento das diferentes realidades latino-americanas em uma única problemática, apoiando-se nas consistentes similaridades entre os povos da região.17 Ribeiro também idealizou a criação do Centro Brasileiro de Estudos da América Latina (CBEAL), para servir como braço acadêmico do memorial - um órgão de concertação reunindo três universidades públicas paulistas (USP, Unesp e Unicamp), a Fundação de Amparo à Pesquisa do estado e a Secretaria de Desenvolvimento, devotado ao fomento e debate de ideias e pesquisas que pudessem transformar o memorial em um centro catalisador de iniciativas para o desenvolvimento latino-americano.15 17
Do ponto de vista arquitetônico, a construção do memorial representaria para Niemeyer a oportunidade de aplicar no Brasil os avanços tecnológicos utilizados na década anterior no projeto da Universidade de Constantine, em Alger.11 A volumetria dos principais edifícios seria resolvida por meio de grandes superfícies de concreto e vidro, com contrapontos verticais bem marcados. Os edifícios seriam dotados de estruturas ousadas - destacando-se, sobretudo, a biblioteca com os apoios situados fora do prédio, unidos por uma viga de 90 metros de extensão, permitindo um interior totalmente livre, e o auditório com três abóbadas, podendo ser considerado como uma espécie de releitura de seu trabalho na Igreja da Pampulha.18 A unidade do conjunto seria garantida pelo uso generalizado de superfícies curvas, pintadas de branco. As obras do memorial foram iniciadas ainda em 1987 e finalizadas dois anos depois. A construção envolveu mais de mil trabalhadores.19
O complexo foi inaugurado em 18 de março de 1989. Em 8 de julho deste mesmo ano, Orestes Quércia sancionou a Lei n.º 6472, instituindo a Fundação Memorial da América Latina2 , conferindo ao equipamento recém-criado status de órgão administrativa e financeiramente autônomo.20 Na época de sua inauguração, registraram-se diversas críticas à execução do projeto. Construído sem licitação, o memorial custou ao erário dez vezes mais do que o valor inicialmente previsto.21 22 O partido arquitetônico também dividiria a crítica especializada.22 23
Nos primeiros anos de funcionamento, o Memorial da América Latina ganharia visibilidade pelos eventos direcionados a públicos abrangentes, sobretudo espetáculos gratuitos de música que reuniam milhares de pessoas.17 Estão inclusos nessa relação, entre outros, nomes comoMercedes Sosa, Astor Piazzolla, Libertad Lamarque, Caetano Veloso e Tom Jobim. Outros eventos artísticos de relevo no período foram as apresentações do Balé Nacional de Cuba, da Orquestra Filarmônica de Israel (sob a regência de Zubin Mehta) e da Orquestra Jazz Sinfônica. No campo das artes visuais, o Memorial sediou importantes mostras, como as retrospectivas de Johann Moritz Rugendas, Fernando Botero eOswaldo Guayasamín, além de uma exposição dedicada ao escritor e fotógrafo Juan Rulfo.24 O Memorial também buscou fomentar a produção cultural própria, criando a revista Nova América, destinada a difundir manifestações artísticas e culturais do continente e promover o intercâmbio das comunidades acadêmicas, intelectuais e artísticas. Lançada em 1989, a revista atualmente possui periodicidade trimestral e tiragem de 3.000 exemplares, distribuídos para bibliotecas públicas e universidades latino-americanas e espanholas e também comercializada em alguns pontos de São Paulo.25 26
Na condição de sede do Parlamento Latino-Americano e por meio das atividades desenvolvidas em torno do projeto "Presidentes da América Latina", instituído em 2006, o Memorial recepcionou importantes autoridades do mundo político e intelectual, desde embaixadores e cônsules a chefes-de-estado. Estiveram presentes no espaço, entre outros, Mikhail Gorbachev, Bill Clinton, Fidel Castro, Mário Soares, Eduardo Duhalde,César Gaviria, Hugo Chávez, Papa Bento XVI e os mandatários brasileiros Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.24 27 28
Mais recentemente, o memorial tem buscado oferecer atividades voltadas à formação de público e à difusão da produção cultural latino-americana contemporânea.17 22 Dentre essas iniciativas, destacam-se o Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo29 e o Festival Ibero-Americano de Teatro30 . Em abril de 2006, foi criada a Cátedra Memorial da América Latina, visando promover o desenvolvimento de temas relevantes, mediante estudo sistemático das realidades culturais, históricas e políticas dos países latino-americanos, agraciada com a chancela da Unesco em 2007.31 32 Em 2009, o Memorial lançou a Biblioteca Virtual da América Latina, com o objetivo de organizar e divulgar recursos de informação sobre a região e coordenar mecanismos de acesso e disseminação da produção cultural, artística e técnico-científica das instituições representativas na área.33 34 Destaca-se também o projeto Sementeira, destinado a esti
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