domingo, 6 de julho de 2014


Trágico Amor


1923 - Nene Romano - Saudade Sampa
Nene Romano em fotografia de data e autoria desconhecida – Retirada do blog Saudade Sampa
Bom Dia!
TRÁGICO AMOR.
Romilda Machiaverni aportou no Brasil aos dois anos de idade. Ainda adolescente, trabalhou como costureira no bairro do Brás e depois como camareira no Hotel Bella Vista, na Rua da Boa Vista, centro da cidade.
A personagem de nossa narrativa seria mais uma dentre as milhares de imigrantes italianas chegadas a São Paulo com a família para “fazer a América”, não fosse a sua estonteante beleza, suas feições de rara perfeição estética. Seus atributos físicos logo chamaram a atenção de toda a gente e, cansada da vida prosaica que levava, não demorou para que começasse a frequentar as altas rodas, como acompanhante de políticos e milionários. Tornou-se o que se chamava na época a “cortesã”, uma espécie de prostituta mais refinada. Adotou então o codinome de “Nenê Romano” e passou a ser muito admirada pelos homens e odiada pelas mulheres.
Em 1918, Nenê contava 21 anos e participava do famoso entrudo (carnaval) na Avenida Paulista. Um de seus muitos admiradores entregou-lhe furtivamente um bilhete de amor, seguido de um beijo nas mãos. Os gestos não passaram despercebidos a uma abastada senhora da sociedade, filha de fazendeiros de café na região de Ribeirão Preto. “Sinhá” Junqueira era o seu nome. Interessada que estava no rapaz autor do bilhete, foi tomada de cego ciúme e resolveu vingar-se, não nele, mas nela: contratou dois capangas para lhe aplicar um corretivo. Os dois desferiram no belo rosto de Nenê uma navalhada, que lhe rendeu uma indelével cicatriz. O laudo médico dizia que “houve deformidade à estética do rosto”.

Moacyr de Toledo Piza em fotografia de data e autoria desconhecida
Denunciada, a mandante do crime nada sofreu, sendo condenados apenas os dois capangas. O processo foi engavetado, pois se tratava de uma denúncia de uma meretriz contra uma família poderosa. Decidida a entrar com ação de indenização contra Sinhá Junqueira, Nenê Romano procurou um dos mais renomados advogados de São Paulo na época. Era Moacyr Toledo Piza, 29 anos, de família tradicional, formado na turma de 1915 da Academia de Direito do Largo de São Francisco, jornalista, poeta, sobrinho de senador e irmão de deputado.
Os dois se apaixonaram. Ela, muito; ele, demais. Durante dois anos viveram um amor louco, intenso, muito comentado, apontado e recriminado nas conversas de família. Viviam vagando pelas pensões, pelos bares, teatros e carros alugados, desfrutando aquela paixão que imaginavam nunca teria fim. Mas era impossível para ambos pensar em casamento, já que pertenciam a mundos completamente diferentes.
A paixão corroeu as energias do jovem advogado a ponto de ele não conseguir mais trabalhar e até de ignorar os amigos. Ela, porém, foi-se enfastiando da relação até negligenciar a exclusividade que vinha dedicando a Moacyr. Passou a sair com outros homens e não fazia questão de escondê-lo, até o dia em que resolveu romper o relacionamento. Moacyr, claro, enlouqueceu ainda mais.
No dia do aniversário dela, em 25 de outubro de 1923, enviou-lhe um buquê de rosas e um faqueiro de prata, presentes que ela recusou. Moacyr foi procurá-la em sua casa e chegou no momento em que ela saía num carro de praça. Temendo um escândalo em frente de casa, ela pediu que ele entrasse no táxi e este continuou a rodar. Quando passavam pela esquina da Rua Sergipe com a Avenida Angélica, Moacyr desferiu quatro tiros em Nenê. Depois de vê-la murmurar “Ai, Moacyr!”, ele se suicidou atirando contra o peito e caiu sobre ela. As amigas de Nenê colocaram sobre seu caixão as flores que ela havia recusado.
Moacyr de Toledo Piza foi sepultado no Cemitério da Consolação e em seu jazigo está a obra “Interrogação” de Francisco Leopoldo e Silva (1879-1948). A obra é conhecida como “Interrogação” (veja os detalhes obra na legenda da imagem). Não sei informar onde foi sepultada Nenê Romano.

A obra, base tumular em granito suportando uma imponente escultura expressionista em granito natural polido. Representa a figura de uma mulher sentada em toda a sua nudez, com as pernas cruzadas. Com a cabeça curvada junto ao braço direito, apóia o cotovelo sobre o joelho do mesmo lado. A mão esquerda mantém apoiada no solo, ligeiramente atrás do corpo. Próximo ao pé da perna direita há uma esfera. Essa composição escultural foi feita de tal maneira que representa um ponto de interrogação, por isso a obra é intitulada: “Interrogação” (veja a representação na foto). O autor, com o vigor da sua escultura num acentuado lirismo límpido, a inocência sensual de seus nus funerários expressa uma certa resistência da vida em face da morte, quis deixar para o observador um ar de dúvidas pelo fato ocorrido com o casal. Quatro bases de granito ladeiam o tumulo, apresentando na parte frontal o nome do sepultado.
Fontes:
Texto: Eli Mendes (Blog Saudade Sampa)
Descrição Tumular: Hélio Rubiales (Blog Eternity-Art Cemitério da Consolação)
Foto: Felipe Alexandre Herculano (Sampa Histórica)

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